Além das secas, existem também os conflitos urbanos, impondo restrições a circulação de pessoas e é preciso que isso seja incorporado na agenda do direito humanitário internacional e nas ações políticas de movimentos sociais nacionais.
Esta situação dramática foi mencionada durante o debate “Os Diferentes Sentidos dos Direitos Humanos na Política Contemporânea”, durante o 35º Encontro Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs). Reunidos em Caxambu (MG), os professores da Universidade Nacional Autónoma do México e da McMaster University, do Canadá, concluíram que não é preciso “reinventar a roda” em relação às leis, mas trabalhar com “o que já existe”.
A professora Ariadna Lopez, da Universidade do México, citou que tanto os refugiados ambientais quanto os de conflitos armados devem ter suas lutas inseridas no contexto de movimentos sociais. Por meio de mecanismos próprios como manifestações nas ruas e pressão sobre a agenda política, esses grupos podem cobrar mudanças nos marcos legais e o cumprimento de leis. Para ela, a ampliação de convenções, como defendem ativistas, é uma alternativa “muito lenta”.
“Levará um tempo para incluir determinadas lutas na ONU. Tem que passar por muitas discussões e protocolos de direitos sociais e culturais que leva tempo”, avaliou. “Há outras entradas jurídicas, mas sem a mobilização das pessoas não vai ocorrer. Segunda a mexicana, as classes políticas “não têm interesse de ampliar [os direitos]”. “Eles querem fechar a lei para não politizar a discussão que já é política”, completou.
A professora se referia à Convenção de Refugiados, aprovada pelas Nações Unidas em 1951. O documento estabelece que um refugiado é alguém que “temendo ser perseguido por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país”. Portanto, não reconhece refugiados ambientais ou de conflitos armados.
O professor Bonny Ibhawoh da McMaster University, do Canadá, que participou do debate, concorda com Lopez e cita o poder de pressão das instituições de direitos humanos, que foram responsáveis pela Declaração Internacional sobre os Direitos dos Povos Indígenas, após 20 anos de negociações. Aprovada em 2006, a convenção enfrentou a pressão contrária de países com expressiva população indígena, como a Nova Zelândia e a Austrália, além dos Estados Unidos e do Canadá.
Paralelamente à disputa política, Ibhawoh avalia que as organizações humanitárias não podem depender apenas do Estado para atuar de forma eficaz. Ele sugere que sejam criadas estratégias de atuação por parte das instituições, como fazem empresas privadas em territórios em conflito ou em crise humanitária. Ele cita o caso da Coca-Cola, na Somália. No país, pessoas que se identifiquem como funcionários da multinacional conseguem atravessar o país sem enfrentar as mesmas dificuldades que os comboios com alimentos.
“Veja o caso da Somália: não é preciso Estado para ter organizações privadas. Um crachá [de funcionário] da Coca-Cola é quase um passaporte para cruzar as milícias no interior do país e chegar à população”, relatou Ibhawoh. Segundo o canadense, nesse caso, a corporação, por causa da globalização, é mais forte do que o Estado e funciona “independentemente do que acontece”. “O sistema de direitos humanos deve conseguir a mesma coisa”, concluiu, conforme Agência Brasil/Isabela Vieira, enviada Especial.