Brasília – Mesmo com o adiamento da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o Artigo 5º da Lei de Biossegurança, que autoriza o uso de células-tronco embrionárias em pesquisas, o Ministério da Saúde manteve a decisão de criar o Instituto Nacional de Terapia Celular (INTC). Pesquisadores da área manifestam expectativa diante da possibilidade.
O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, informou na última quinta-feira (6) que a rede brasileira de terapia celular deverá estar em atividade em abril. Segundo Temporão, o INTC será uma rede de conhecimentos virtual, para troca de experiências sobre pesquisas com células-tronco por um conjunto de instituições de pesquisas, centros universitários e institutos, como o Instituto Nacional do Câncer (Inca) e o Ludwig em São Paulo. Há dois anos o país conta com uma rede de banco de sangue de cordão umbilical e placentário, com quatro laboratórios e cerca de 5 mil cordões armazenados.
Para o pesquisador Antônio Campos de Carvalho, do Instituto Nacional de Cardiologia de Laranjeiras, no Rio de Janeiro, a iniciativa do governo é fundamental para que o Brasil permaneça na posição de destaque que alcançou nessa área e possa oferecer à sociedade as melhores opções em termos de medicina regenerativa no futuro.
“A criação de um instituto nacional permitirá organizar e coordenar as pequisas e criar as condições de infra-estrutura para que os grupos de pesquisa tenham acesso mais fácil a reagentes, equipamentos, cursos de treinamento para os estudantes e técnicos”, prevê. “Com uma coordenação centralizada, penso que avançaremos com mais rapidez e eficiência nas pesquisas e aplicações das células-tronco.”
Carvalho avalia que a interrupção do julgamento no STF não irá interferir no resultado final, e que deve ser indeferida a ação direta de inconstitucionalidade (Adin) contra o uso das células-tronco embrionárias. “Espero apenas que o Supremo não adie o julgamento por muito tempo, pois essa indefinição certamente não ajuda no desenvolvimento da pesquisa”, comenta.
Para o pesquisador José Eduardo Krieger, diretor do Laboratório de Genética e Cardiologia Molecular do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas de São Paulo, a criação do INTC consolida um posicionamento do governo federal de financiar mais pesquisas.
“Os agentes de financiamento foram muito felizes quando aproveitaram esse nicho de oportunidade que foi a criação de uma coisa nova nesses últimos sete anos: a perspectiva de fazer a reparação de órgãos adultos com terapias celulares e fazer o investimento, porque identificaram que existia uma massa crítica incipiente de pesquisadores no país”.
Krieger lamentou o adiamento no STF: “Foi muito ruim na medida em que o país deu um exemplo de maneira relativamente rápida ao colocar uma regulação nessa área e, com a colocação dessa Adin e finalmente agora com o julgamento, começa-se a se questionar isso. Talvez, para o gosto dos pesquisadores, essa lei [a Lei de Biossegurança] não fosse tão abrangente quanto a gente queria, mas ela foi muito importante porque deu passos gradativos e uma série de salvaguardas”.
Na avaliação do professor Stevens Rehen, do Departamento de Anatomia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a criação do INTC ajudará os pesquisadores a trabalhar em conjunto.
“Talvez eu tenha como contribuir para treinar outros pesquisadores em outras regiões do Brasil na minha área de pesquisas, eu quero aprender com outros pesquisadores de outras áreas, de outros estados, e é a partir de redes de conhecimento, redes virtuais e reais, onde a gente possa interagir fisicamente, trazer estudantes, levar estudantes, que a gente vai ter condições de competir como nação para o desenvolvimento de novas tecnologias baseadas em células-tronco”, afirma o professor, que preside a Sociedade Brasileira de Neurociências e Comportamento (SBNeC).
Rehen espera que o STF não demore a julgar novamente a Adin que decidirá se os cientistas poderão usar células-tronco embrionárias em pesquisas. “Isso acaba gerando uma desaceleração nos investimentos federais e nos grupos de pesquisas que têm como prioridade investir nessa área”, afirma o pesquisador, que trabalha com a produção em grande escala de células-tronco embrionárias com o objetivo e teste em animais com lesões medulares.
De 2005 para cá, os Ministérios da Saúde e da Ciência e Tecnologia investiram cerca de R$ 24 milhões em pesquisas com células-tronco. Naquele ano, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) aprovou 45 projetos na área, dos quais 39 eram pesquisas com células adultas e seis com embrionárias. Nesses projetos foram investidos R$ 10 milhões, sendo R$ 2 milhões para as pesquisas com células-tronco embrionárias.
A lista de pesquisadores que tiveram projetos com células-tronco embrionárias aprovados inclui três cientistas de São Paulo (Mayana Zatz, Lygia da Veiga Pereira e José Eduardo Krieger, da Universidade de São Paulo – USP), dois do Rio de Janeiro (Antônio Carlos Campos de Carvalho e Stevens Rehen, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ) e uma de Goiás (Lídia Guillo, da Universidade Federal de Goiás – UFG). Há estudos sobre mecanismos de diferenciação e uso terapêutico da células-tronco embrionárias, sobre a expansão in vitro desse tipo de células e controle de sua diferenciação.
Irene Lôbo
Repórter da Agência Brasil